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sábado, 10 de julho de 2010

Circulação

Diga outra coisa, sobre outro assunto, use outras palavras, por favor, eu te peço: não aguento mais a conformidade de nossas coisas, a conformidade de nossos desejos. Tudo atira para o mesmo buraco e com o tempo o buraco vira fossa, vira precipício, nele eu caibo inteira. Ela o diz. Ele a olhando. Não tinha que ser assim, não precisava, não precisa, ainda há tempo… O que você quer? Ele nada diz. Nada? Ela o pergunta. Ele fica mudo, não precisa falar nada porque sabe que ela… Você é incrível, sabia? Melhor! Você é impagável? Será mesmo que vai durar muito tempo preso dentro dessa resignação orgulhosa? Não vai quebrar, não vai sair para passear, onde está você dentro desse você que escolheu ser para amenizar o percurso? Desculpe-me. Você deveria ter sido mais prudente. O tempo avançou, você sabe, ele não para. Ingênuo. Se olham, talvez pela última vez, é só que você nunca existiu de fato. Apenas ficou alimentando em si um futuro que agora acabou de chegar. Portanto, eu me despeço. Não dava mais para continuar contigo. Está cada vez mais pesado e gordo. Está cada vez mais estático.

Avançou até uma gaveta e dela retirou um martelo. Espatifou num só tiro o porco de cerâmica todo pintado. E fez jorrar sobre o chão da sala um rio de moedas, hoje, já nem mais em circulação.

O tempo tinha mesmo passado. Os sonhos não aguentam muito se trancafiados, descobriu, antes de tomar o banho para dormir e perceber mais do que nunca que sozinha estava. Sem porco, sem sonho aprisionado, sem destino sendo feito, alimentado…

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