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sábado, 24 de outubro de 2009

Roberto

Elisa,
achei melhor começar direto com o seu nome. Faz tempo que me sento para te escrever isso que agora chega a ti revoltado. Tudo o que já estás lendo está irritadiço, incontido, descontrolado. Não pedirei desculpas. Você merece cada palavra. Eu mereço cada segundo passado sozinho ao te escrever o que vou dizer. Não direi não te amo. Nunca acreditei que fosse amor, isso entre a gente. Mas o tempo passou. Você passou. A chuva daquele dia passou. As coisas não persistem tanto assim. Elas querem todas finalizar. Por isso eu te escrevo essas coisas, com a caneta numa mão e o coração na outra. Não porque está difícil aguentar, justamente o contrário, é porque daqui a pouco eu o vou esmagar. Apertar o peito externado e jorrar sobre a mesa de vidro um sangue antigo, mal passado, desnutrido. É o nosso fim. Eu quis assinar, dizer, divulgar, transformar em fato. Em fatídico fim formatado. Transformado em verso, rimado. Se não conseguimos nos manter com isso que nos consumiu, que ao menos umas poesias eu possa fazer. Que ao menos alguma felicidade disso possa nascer. Qualquer tipo de felicidade, mesmo a nervosa. Mesmo a apática. Felicidade hoje quer dizer qualquer coisa que não essa a nossa. Desculpa, disse que não ia me desculpar. Mas mesmo assim, eu devo dizer, acabou. Estou indo, se agora você gritar, espero que ninguém a possa perceber. Eu já não o vou. Eu, aliás, já faz tempo que quero, sim agora eu vou. Sem dor. Sem descontentamento. Sem nada porque fui todo consumido e já nem sei o que perdi. Não carrego em mim sensação de perda, estou completo. Completamente perdido. Completamente sem chão sem parede sem rede que me pegue de volta sem vergonha sem sequer alguma dor própria. Você me transformou em cotidiano. Me transformou em prosa, em primeira conjugação. Não posso mais, desejo estourar. Fica, então, com a memória. Fique com o que puder lembrar. Vou correndo, vou pelo mar. Vou me afogando, sem chorar. Sem metáforas. Sem respostas. Decido-me agora partir sem te dizer nada além do que isto, eu parto. Se vou daqui me lançar, me queimar em fatias, despencar, rugir, gritar até secar, não importa, importa? Você se quiser que se ponha a me procurar, mas adianto... Parto agora para ser eterno. Divido-me em pedaços, é a dica que a ti desespero. Já me perco outra vez e me perder, talvez só agora, é o que eu realmente quero, portanto, eu parto

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